26 de maio de 2012

QUIXOTE, UM PERSONAGEM COM EXCESSO DE RAZÃO - Sérgio Lagranha

Dom Quixote e Sancho Pança criaram Miguel de Cervantes ou foi o contrário? Com este questionamento o poeta, escritor, membro da Academia Brasileira de Letras, Carlos Nejar, iniciou sua palestra no 1º Encontro do Núcleo de Debates entre Direito e Literatura, promovido pela OAB/RS, na noite de quarta-feira, 23, na sede da OAB/RS. “Os elementos da linguagem são misteriosos”, explicou. “Os dois personagens foram talvez as maiores invenções do gênero humano. E nós vivemos do mito.”


Em O Espelho Enterrado, de Carlos Fuentes, o leitor se defronta contínua e reiteradamente com a metáfora do espelho, na qual o nativo deste ou aquele país da América Latina e Caribe, somente consegue ver-se no reflexo do espelho dos outros, ibéricos, franceses, ingleses, norte-americanos. Para Nejar, o enredo de Dom Quixote é o espelho estilhaçado, mas com os dois personagens – Dom Quixote e Sancho Pança - humaníssimos.

Quixote é atual e eterno, representando algo de todos nós que estamos presentes na loucura de Quixote e também na praticidade de Sancho Pança, conforme Nejar. Ressalva que a loucura de Quixote é mansa, organizada. “Gilbert Chesterton escreveu que louco é aquele que tem excesso de razão e Miguel de Cervantes conseguiu criar um personagem assim.”

Segundo ele, Cervantes nunca enlouqueceu, pois o artista nunca enlouquece. O sentimento pode delirar, mas nunca chega a enlouquecer. A lógica em Cervantes existe no autor e não nos personagens. “Um homem exitoso deixa seu lar, um escudeiro também. Partem a cata do desconhecido da alma humana com um olhar que via tudo pelo avesso.” 

Numa taberna de aldeia, que Quixote toma por castelo, lembra Nejar, o taberneiro arma-o cavaleiro da ordem dos cavaleiros andantes e aconselha-o a arranjar um escudeiro. Escolhe para escudeiro o camponês Sancho Pança, e ambos percorrem Espanha. O cavaleiro da triste figura montado no seu cavalo magro e o gordo Sancho Pança, no seu burro, um par arquetípico e um contraste vivo entre o idealista visionário e o realista com a sua esperteza pouco sofisticada. “Quixote é o homem do impossível e nós precisamos do impossível. Este texto nos acompanha. É o texto que nos lê.”

Ilustração de Gustavo Doré
No final do livro, em seu leito de morte, Quixote responde a Sancho Pança, que chora e pede que levante da cama: “o que foi já não é. Fui louco e estou hoje em meu juízo; fui Dom Quixote de la Mancha e sou agora Alonso Quijano, o bom.” No seu epitáfio foi escrito: Morreu, vejam que ventura, com siso vivendo louco!

Durante o evento coordenado pela advogada Helena Ibañez, o advogado e jornalista José Antonio Pinheiro Machado, o psicanalista Júlio Campos e o engenheiro João Inácio Ibañez também comentaram a obra de Cervantes. O mediador foi o desembargador Silvino Lopes Neto. Ainda fizeram parte da mesa o presidente da OAB/RS, Cláudio Lamachia; Secretária-geral da OAB/RS, Sulamita Cabral, o ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal, Paulo Brossard, representando o Instituto dos Advogados do Rio Grande do Sul, Ana Lúcia Piccoli;e a coordenadora do Departamento Cultural da OAB/RS e conselheira seccional, Regina Guimarães. 

Dom Quixote - Foi escrito pelo poeta, dramaturgo novelista espanhol Miguel de Cervantes Y Saavedra (1547-1616), com a primeira edição publicada em 1605. É composto por 126 capítulos, divididos em duas partes, a primeira surgida em 1605 e a outra em 1615. Somente aos 58 anos, com a publicação da primeira parte do livro "Dom Quixote", Cervantes conseguiu a consagração como escritor e passou a se dedicar exclusivamente à literatura. É considerada a grande criação de Cervantes. O livro é um dos primeiros das línguas européias modernas e é considerado por muitos o expoente máximo da literatura espanhola. Em 2002, foi escolhida por escritores de renome internacional como a melhor obra de ficção de todos os tempos.


Extraído do sítio Jornal Já

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