31 de dezembro de 2011

NO TURBILHÃO - Antero de Quental



No meu sonho desfilam as visões,
Espectros dos meus próprios pensamentos,
Como um bando levado pelos ventos,
arrebatado em vastos turbilhões…

Num espiral, de estranhas contorções,
E donde saem gritos e lamentos,
Vejo-os passar, em grupos nevoentos,
Distingo-lhes, a espaços, as feições…

- Fantasmas de mim mesmo e da minha alma,
Que me fitais com formidável calma,
Levados na onda turva do escarcéu,

Quem sois vós, meus irmãos e meus algozes?
Quem sois, visões misérrimas e atrozes?
Ai de mim! ai de mim! e quem sou eu?!…


Extraído do sítio Blog dos Poetas

O CÃO E O HOMEM - Carlos Heitor Cony



Já vi a mesma cena, aqui e no exterior. E acredito que todos nós já vimos coisa igual em qualquer parte do mundo.

Em Frankfurt, ainda ao tempo em que havia o muro de Berlim (na Alemanha havia disso), vi o mendigo do Primeiro Mundo estendido na calçada, cozinhando vasta bebedeira - havia umas 30 latas vazias de cerveja em volta dele.

Esparramado na calçada, ele atrapalhava o movimento dos passantes. Mas ninguém, nem mesmo os policiais, se atrevia a mexer nele, a recolher as latinhas de cerveja. Não era piedade nem um cochilo na tradicional vocação à ordem dos alemães.

É que o mendigo tinha ao lado um cão, que nem precisava latir para guardar o dono. Parecia um vira-lata, talvez o fosse. Tomava conta daquele pedaço da calçada, protegendo o sono do homem que com ele repartia os restos de comida arranjados nos restaurantes em volta.

Semana passada, em São Paulo, saindo do hotel, na Avenida Ipiranga, vi a mesma cena, o mendigo, emborcado num canto do edifício Copam, e o cão ao lado, velando pelo dono. Se um milionário o chamasse, oferecesse incenso, ouro e mirra, o cão não se afastaria de sua guarda. Se um santo passasse e o atraísse para um monastério habitado por anjos e atapetado de flores, o cão nem se mexeria dali.

E o dono podia ser um desclassificado, um homem repudiado pela sociedade, pela família. Nem os pais nem os filhos nem os amigos querem saber dele, acham que o miserável está tendo o que merecia.

Para o cão, nada disso tem importância. O dono pode ser rei ou mendigo, santo ou criminoso. Fica a seu lado, sem esperar outra recompensa a não ser a de sentir o cheiro e a onipotência do homem, o homem frágil, tombado na rua, que ele protege daqueles que o abandonaram.

* Folha de São Paulo - 12/06/2001


Extraído  do sítio da Academia Brasileira de Letras

30 de dezembro de 2011

O JOGO DE ILUSÕES DE THOMAS WREDE

Fotógrafo de Munique brinca com a realidade através de suas incríveis imagens. Seu material: uma câmera, maquetes e locais escolhidos a dedo.


Extraído do sítio Deutsche Welle

NO ANO PASSADO... - Mário Quintana



Já repararam como é bom dizer "o ano passado"? É como quem já tivesse atravessado um rio, deixando tudo na outra margem...Tudo sim, tudo mesmo! Porque, embora nesse "tudo" se incluam algumas ilusões, a alma está leve, livre, numa extraodinária sensação de alívio, como só se poderiam sentir as almas desencarnadas. Mas no ano passado, como eu ia dizendo, ou mais precisamente, no último dia do ano passado deparei com um despacho da Associeted Press em que, depois de anunciado como se comemoraria nos diversos países da Europa a chegada do Ano Novo, informava-se o seguinte, que bem merece um parágrafo à parte:

"Na Itália, quando soarem os sinos à meia-noite, todo mundo atirará pelas janelas as panelas velhas e os vasos rachados".

Ótimo! O meu ímpeto, modesto mas sincero, foi atirar-me eu próprio pela janela, tendo apenas no bolso, à guisa de explicação para as autoridades, um recorte do referido despacho. Mas seria levar muito longe uma simples metáfora, aliás praticamente irrealizável, porque resido num andar térreo. E, por outro lado, metáforas a gente não faz para a Polícia, que só quer saber de coisas concretas. Metáforas são para aproveitar em versos...

Atirei-me, pois, metaforicamente, pela janela do tricentésimo-sexagésimo-quinto andar do ano passado.

Morri? Não. Ressuscitei. Que isto da passagem de um ano para outro é um corriqueiro fenômeno de morte e ressurreição - morte do ano velho e sua ressurreição como ano novo, morte da nossa vida velha para uma vida nova.

Fonte: Sítio Pensador.info.

MALDIÇÃO NO RIO GUAÍBA - Tau Golin

Há anos, o Rio Guaíba é meu território líquido, espécie de rincão fluído, de onde me olho e examino, em muitos momentos, o mundo. Revolvo sua história, sinto sua pulsação e vejo seu doloroso e lento definhamento. Examino sua cartografia histórica, os relatos de várias gerações, os encantamentos e também a simples exploração. Eu o habito e, como alteridade, ele também mora em mim.

Atualmente, o Rio Guaíba é o espectro de uma velha prostituta de arrabalde. Os porto-alegrenses a pintam, enfeitam, enquadram suas silhuetas com potentes máquinas fotográficas, especialmente contando com a luminosidade do pôr do sol. À distância, a reverenciam de longe porque, na verdade, se valer a comparação, está contaminada por múltiplas doenças venéreas, tomada pelos vírus inoculados pelo poder público e habitantes, resultado da relação perversa, manipuladora, calculista de lucros e abandonos. Ainda precisam dela para o encantamento de convidados manipuláveis, através da figuração de uma vedete de carnes podres e perebentas, encobertas por meias cintilantes, lantejoulas e luzes ilusórias para manter o devaneio. A diva, na foto e no ciberespaço, em sua dimensão virtual, está linda, deslumbrante. A condição digital ilude que está podre, a deusa vive purulenta, senhores!

Esta prostituta já não dá mais no couro. Só existe para alimentar a pantomina saturnal de uma falsa luxúria rio-grandense.

Mas a prostituta está condenada e não morta. Ela é uma gata decadente de mais de sete vidas, impossível de exterminar, e que ainda pode gerar forças medonhas.

Foto: Tau Golin
Há décadas vem sendo violada, suas margens exprimidas, entulhada com detritos. Ninguém a higieniza. Fogem dela. Gigolôs photoshopes adoram cultuá-la apenas como imagem maquiada. Retiram seu espaço e sinergia líquida… É um deslumbre asséptico apenas na mente de seus cultuadores.

Entretanto, na realidade, por mais que a maltratem, a velha prostituta aparentemente vencida, é constituída por uma matéria inalterável, insubstituível. Pode ficar pastosa, porém jamais perde a sua condição. Sua dimensão e realidade encontram-se na eternidade da forma fluída. E um dia, com já preveem algumas trombetas apocalípticas, inspiradas em encíclicas científicas e prováveis, fiquem certos, já sem espaço, ela vai explodir sobre aqueles que a manipulam. Seu espectro não será mais de cartão postal, mas de devastação, com a fúria de uma enchente catastrófica. Chuvas torrenciais e contínuas no Planalto e na Serra, combinadas com ventos fortes do quadrante Sul, represores das águas, podem espalhar a mortalha sobre as populações ribeirinhas e suas imprudências.

Neste momento hipotético, não veremos seus algozes junto às suas “obras”. Naufragarão as placas de bronze. Como se sabe, o poder sempre reside na cidade alta, no cume dos edifícios, ou, mantido pelo erário do povo, muda-se para longe da cacaca que fez, não impediu ou procurou sustar. Seria uma cena hilária prefeitos, secretários e governadores flutuando no Guaíba como parte do esgoto e do entulho que o condenaram. Lamentavelmente, de tanto estropício, a velha prostituta ficou cega e não pode identificar seus algozes. Ela é, por natureza, pública. E abraça a todos.

Três problemas aportaram no Rio Guaíba: o assoreamento; a condição de cloaca porto-alegrense; e as obras no seu entorno e leito.

O mais notável é que o poder público olha o Guaíba de todos os ângulos, menos do da navegação. Nessa mirada, as iniciativas ainda são acanhadíssimas. Se considerarmos a carta náutica 2109, da Marinha do Brasil, cujas medições de profundidade são de 1964, a área de navegação já era pífia. Considerando o espelho d’água circunscrito da latitude da Ilha dos Marinheiros/Navegantes (29º59’36’’S) a da Ponta do Jacaré/Pedras de Belém Novo (30º14’S), um barco, com um metro de calado, tem restrições de singradura de 30 a 35%; com aproximadamente dois metros, de 60 a 70%. O mundão do Guaíba, assim, se reduz para 30 a 40%. De fato, em torno de 70% não existe para a navegação de barcos acima de dois metros de calado (para os não iniciados, a parte da embarcação que fica embaixo da água). O mais grave é que, com calado acima de dois metros dificilmente vai chegar nas áreas navegáveis, porque os baixios estão na costa, sem canais que conduzam as partes mais profundas. A partir deste calado, navegar apenas no canal dos navios ou suas proximidades. Ainda assim, com sérios riscos, pois as dragagens do canal são lançadas nas suas imediações, formando bancos submersos, não sinalizados. A hidrovia, com profundidade de 6 metros, no entanto, está com diversos locais assoreados.

Foto: Tau Golin
Todo rio quer ser profundo. O Guaíba somente se salvará e poderá cumprir uma função transcendental se aumentar a sua profundidade. Retornar às condições anteriores, mas também abrir canais que retirem as populações do isolamento, que permitam os desenvolvimentos dos clubes náuticos e formem marinas públicas. A náutica é um dos setores fundamentais da economia, formadora de profissionais (fibra, toldaria, elétrica, hidráulica, ferragem, pintura, marinharia, etc.) e distribuição de renda. Teremos que escolher entre continuar a vê-lo, ou optar por vivê-lo.

No geral, seu fundo é de areia e terra. Com o avanço da tecnologia dos maquinários, construir hidrovias e desassoreá-lo é uma tarefa relativamente fácil.

Alguns dos meus amigos de “defesa” do meio ambiente que me perdoem, grande parte dessa transformação pode ser realizada sem custos ao estado, desde que se negociem áreas estratégicas com as areeiras. O Rio depende da vida humana que estiver nele. É simplesmente ridículo o povo ficar pagando dragagem para os prestadores de serviço jogarem sedimentos e areia de um lado para o outro devido a proibição de “remover” o que está no seu leito. Sem contar com as consequências econômicas de oferta a construção civil.

Nas últimas décadas, a navegabilidade do Guaíba piorou consideravelmente. Não existe serviço de desassoreamento das toneladas de entulhos e areia que entram no estuário. São diversos rios, sangas e arroios bombando diariamente para dentro dele. Entram árvores, taquareiras, móveis, aparelhos eletrônicos, etc. Grande parte aloja-se no fundo, servindo de “alicerce” para a formação de bancos e ilhas, além do assoreamento das margens. Em muitos casos, árvores afloram da água; em outros, ficam submersas como armadilhas para os barcos. Hoje, navegar no Guaíba é uma temeridade. Os navegantes sofrem acidentes, com consequências físicas e prejuízos materiais. Além da trafegabilidade, constituem obstáculos condenatórios do Rio. Os últimos esforços para remover os mais ameaçadores ocorreram há alguns anos através do site www.popa.com.br.

Por isso, é um descalabro as duas grandes obras em planejamento e execução. A prevista sobre o porto de Porto Alegre invade o Rio e retira área navegável. Causa prejuízo igualmente a possibilidade de fortalecimento da memória rio-grandense e uma consciência sobre a historicidade da navegação, preponderante na conquista, povoamento e desenvolvimento do estado. Antes de tudo, aquele deveria ser o seu espaço. O lugar de acervos, monumentos e estudos, com a criação de um museu das embarcações, onde se mostrasse o mundo do trabalho náutico; um memorial e um arquivo; um “rionário”, com espécies dos nossos rios, lagoas, etc. E depois, vá lá, a reprodução do mundinho classe média, deduzível das visitinhas rápidas a Europa e a Argentina, incapaz de pensar instalações vocacionadas com a nossa história.

Nossos papagaios possuem ojeriza às escamas.

Foto: Tau Golin
Decididamente, o que está projetado não é a “revitalização” do Rio, mas a especulação de sua margem e a usurpação de seu leito navegável.

Tudo o que se pensa para o complexo do porto e da Usina do Gasômetro, com vantagens e economia, poderia-se transferir para o espaço entre o arroio Dilúvio e as imediações do Iberê Camargo. Até o meio do Rio trata-se de uma área inútil, um baixio que não serve para quase nada. Na linguagem da economia, aquele é o lugar para ser valorizado, com obras na costa, com marinas (inclusive a pública) piers e abertura de canais, restaurantes, bares, instalações culturais, etc. Mas investidor, com se dizia antigamente, só quer “mumu”.

A última maldição do Guaíba, um crime de proporções inarráveis, é o merdário, embutido em uma obra fundamental, aplaudível e expressa no Programa Integrado Socioambiental – Pisa. Entretanto, a parte inserida no leito do Rio é discutível, questiona seus planejadores e as decisões de poder que chancelam as gestões da aventura. É a expressão do faraonismo terceiro-mundista, que, quase sempre, junto com uma medida de promessa gigantesca traz embutida ameaça de efeito retardado, de consequências dramáticas. A dobradinha estado-município do passado fez do merdário o seu estandarte; José Fortunati e alguns de seus secretários, agora, se agarraram aos tubos do esgoto como flutuantes de propaganda eleitoral.

Popularmente, denomina-se merdário a obra do Emissário Cristal/ETE Serraria (Subaquático), que vai receber o esgoto porto-alegrense nas imediações da Hípica do Cristal e o conduzir por dentro do Guaíba até a Serraria. Poderia ter parado no reduto dos cavalos, pois a estação de tratamento de esgoto cabe no espaço vazio entre a raia circular. Naquela antiga doação pública, seria educativa, com um parque espetacular. Ou pequenas estações resolveriam o problema. Ou a condução dos tubos por terra. Ou ainda junto à costa, onde, com mais facilidade, os problemas seriam resolvidos. Mas a engenharia especulativa gosta de riscos. Prefere contrariar soluções aconselhadas por técnicos divergentes e mais prudentes com obras ameaçadoras e de caríssima manutenção. Parecem torcer por acidentes para renovarem contratos.

Somente no espaço molhado, está orçada em R$ 84.474.759,33. No conjunto, são 83 milhões de dólares do BID; 316,2 milhões de reais da CEF; e 67,1 milhões de reais da Prefeitura de Porto Alegre.

A não ser a cantilena publicitária eleitoral, o merdário, desde a sua origem, está envolto em certos silêncios. Com a exceção de parte dos navegantes e alguns técnicos, um deslumbre parece ter substituído a racionalidade. São canos DE 1600, fabricados em polietileno, com vida útil estimada de 50 a 80 anos, em que passam por dentro indivíduos de baixa estatura a galope.

A nominação é tecnicamente inofensiva: Emissário Subaquático. Dentro do Rio, essa tubulação implica numa adição de toneladas de canos em armação de cimento, algo em torno de dois por dois metros, numa extensão de 10,3 km. A obra de enterramento está deixando os sedimentos do lugar ocupado pelo duto dentro do Rio, não estão removendo para fora. Quando apenas depositados no fundo, convertem-se em obstáculos.

Foto: Tau Golin
Os danos já são evidentes. Uma linha de bancos de areia e ilhas produzidas pela dragagem do leito para passar os canos se formaram, da Ponta do Dionísio a Serraria, uma extensão de aproximadamente 9 km. O espaço mais evidente encontra-se na enseada de Ipanema, cortada longitudinalmente pelo “inofensivo” emissário subaquático. A imobilidade do projeto no papel, entretanto, não corresponde à realidade do Rio em movimento. Com o passar do tempo, a barreira do merdário vai assorear entre a tubulação e a costa, nos lugares em que aflorar do fundo. Deverá ocorrer um nivelamento, reduzindo ainda mais a profundidade. Não esquecendo que, ao largo de Ipanema, onde ele está sendo instalado, a profundidade média é de dois metros. Quase dá pé para o prefeito!

Quando algum cérebro mais iluminado no poder pensar em conectar por água as comunidades litorâneas do Guaíba, certamente terá ali mais um obstáculo. No entanto, existem outras situações muito mais ameaçadoras. Parte do “emissário” passa próximo ao canal de navegação dos navios. No cotovelo do farolete da Piava, não raramente, por dificuldade de manobra ou condições do tempo, os timoneiros não conseguem realizar a “curva” e vão encalhar na costa da vila Assunção. Exatamente, a meio caminho, está a obra subaquática do DMAE. Quando isso voltar a ocorrer, o merdário vai explodir.

Só falta agora tentarem nos convencer que ele é a prova de navio! E o criativo filmezinho propagandístico será mais uma obra de ficção.

Ainda veremos tudo isso aflorar na água. Possivelmente, o nosso pôr do sol refletirá neste cenário. Será a parte superficialmente conhecida. Os mistérios do merdário permanecerão na intimidade de poucos. Anunciado com trombetas salvadoras e inodoras, trata-se, na verdade, de uma maldição agourenta.


Extraído do sítio do jornal Sul21

A ESFINGE - Myriam Fraga

Ingres (francês, 1780-1867), Édipo e a Esfinge
Revesti-me de mistério 
Por ser frágil,
Pois bem sei que decifrar-me 
É destruir-me.

No fundo, não me importa 
O enigma que proponho.

Por ser mulher e pássaro 
E leoa,
Tendo forjado em aço 
As minhas garras, 
É que se espantam 
E se apavoram.

Não me exalto.
Sei que virá o dia das respostas 
E profetizo-me clara e desarmada.

E por saber que a morte 
E a última chave,
Adivinho-me nas vítimas que estraçalho.

Salvador, 1964 - De O Risco na Pele (1979)


Extraído de Boletim nº 273 de Poesia.net do sítio Alguma Poesia


Myriam Fraga - Escritora, poeta, jornalista e biógrafa. Tem 20 livros publicados, entre poesia e prosa. Pertence à Academia de Letras da Bahia e ao Conselho de Cultura do Estado. Participou de várias Antologias no Brasil e exterior, tendo poemas traduzidos para o inglês, francês e alemão. Entre suas recentes publicações: Sesmaria e Femina (poesia), Jorge Amado, Castro Alves, Luis Gama e Carybé (literatura infantil), Leonídia – a musa infeliz do poeta Castro Alves (biografia). É diretora da Casa de Jorge Amado, em Salvador, Bahia, Brasil.

“A poesia de Myriam Fraga insere-se nesta vertente que não apela para o tom confessional do sujeito que canta. Poesia de grande força expressiva, épica e dramática, configura um que se coloca em constante estado de alerta para colher e acolher os resíduos de acontecimentos que constituem a história coletiva através d de seus personagens e seus mitos. “ (...) “E, nesta perspectiva, o tempo e a memória constituem importantes vertentes da poesia desta autora, transformando-se em uma temática que perpassa os vários poemas: Guardo a memória / Do mundo / E amadureço / Intemporal e etérea /No que teço.” EVELINA HOISEL (Antonio Miranda)

29 de dezembro de 2011

ANO DE PORTUGAL NO BRASIL SERÁ CELEBRADO A PARTIR DO PRÓXIMO ANO - Renata Giraldi

Brasília – No período de 2012-2013 será celebrado o Ano de Portugal no Brasil. O comissário-geral do programa e presidente da Fundação Luso-Brasileira, Miguel Horta, disse que a ideia é mostrar a criatividade e o conhecimento português nas artes, na cultura, no pensamento, na ciência, na investigação, na inovação tecnológica e na economia.

Horta disse que planeja realizar de forma simultânea o Ano de Portugal no Brasil e o Ano do Brasil em Portugal. Segundo ele, esse é o terceiro projeto cujo objetivo é divulgar a cultura estrangeira no Brasil. Em 2009 houve o Ano da França e, neste ano, foi comemorado o Ano da Itália.

O programa das comemorações tem início em 7 de setembro de 2012 – Dia da Independência do Brasil – e termina em 10 de junho de 2013 – Dia de Portugal. Nos próximos dois meses, Horta coordenará uma equipe que vai organizar os eventos para o Ano de Portugal no Brasil.

"[Queremos] despertar mais interesse pela cultura e pelos produtos portugueses no Brasil, atrair mais turistas e empresas brasileiras e estreitar vínculos entre as sociedades civis", disse Horta. "Queremos que o Brasil e os brasileiros nos conheçam melhor e gostem ainda mais de nós.”

O trabalho de coordenação-geral dos eventos ficará a cargo do ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros de Portugal, Paulo Portas. Segundo o Conselho de Ministros de Portugal, Portas fará a "supervisão e coordenação do Ano de Portugal no Brasil e da participação nacional no Ano do Brasil em Portugal".

Extraído do sítio da Agência Brasil

Mais informações em Fundação Luso-Brasileira

QUESTÃO DE PONTUAÇÃO - João Cabral de Melo Neto

Todo mundo aceita que ao homem
cabe pontuar a própria vida:
que viva em ponto de exclamação
(dizem: tem alma dionisíaca);

viva em ponto de interrogação
(foi filosofia, ora é poesia);
viva equilibrando-se entre vírgulas
e sem pontuação (na política):

o homem só não aceita do homem
que use a só pontuação fatal:
que use, na frase que ele vive
o inevitável ponto final.





Extraído do blog Poemblog

A BÍBLIA É UM LIVRO CHATO - Luis Ribeiro

Salman Rushdie
E tem mais sangue que um filme do Tarantino.

A liberdade de expressão há-de ter sempre um limite: a religião. É assim quando alguém diz umas verdades sobre o Corão e é assim quando alguém diz umas verdades sobre a Bíblia. Claro que Saramago não foi alvo de uma fatwa e, em princípio, não precisará de um batalhão de guarda-costas, como Rushdie. Mas a História prova-nos que a Igreja Católica evoluiu à força. Não deixou de queimar gente na fogueira por vontade própria ou por ser moralmente superior ao Islão, mas sim porque foi posta no seu lugar, quando perdeu poder com o (re)nascimento dos Estados laicos - coisa que ainda não aconteceu no mundo muçulmano. Não, não me convencem. Se a Igreja ainda tivesse uma fracção do poder que tinha há 200 anos, Saramago não se safava apenas com umas bocas imbecis a sugerirem que entregue o passaporte português.

(Sabiam que a inquisição espanhola durou até 1834? Já rolavam comboios em Inglaterra e nos EUA nessa altura...)

Vamos então à Bíblia: Saramago disse que estava cheio de episódios cruéis e cenas de carnificina. Factualmente, não mentiu e só quem não leu pode dizer o contrário. Eu li.

(Aliás, ter lido a Bíblia foi um dos mais importantes passos que dei na direcção do meu ateísmo. E estou convencido de que muitos dos que se intitulam orgulhosamente católicos só o fazem porque nunca se deram ao trabalho de a ler. Os inquéritos mostram que nove em cada dez portugueses nunca o fizeram, o que para um país com - supostamente - mais de 90% de católicos me parece pouco.)

O Velho Testamento apresenta-nos um deus odioso, macabro, que exige sacrifícios de animais a torto e a direito, que chacina multidões e primogénitos com um estalar de dedos, que se impõe pelo medo e pelo terror. E não me venham com a eterna desculpa das parábolas e das metáforas. Tretas. Com argumentos desses, é possível ver bondade até nos discursos do Hitler.

A Bíblia não é sagrada, é mundana. Uma boa parte (precisamente a parte de que os padres evitam falar) não passa de um chatíssimo manual de costumes, com descrições detalhadas sobre o modo de degolar cabras no altar e de como verter o sangue em ânforas. E não há mal nenhum nisso. Tudo foi escrito com propósitos políticos e sociais fundamentais para a época, com a religião em pano de fundo. Nada de estranhar, num tempo anterior à eclosão da ciência. De estranhar é gente inteligente e do século XXI continuar a socorrer-se desses textos para nortear a sua vida.

Mais interessante é a fé cega de tanta gente em algo escrito por homens comuns. Sim, a Bíblia foi escrita por homens como os outros, com a diferença de espalharem aos quatro ventos que deus falava com eles.

Alexandra Solnado
Mas alguém me explica, por favor, porque é que os que acreditam de olhos fechados nesses tipos são os mesmos que gozam com a Alexandra Solnado, quando a mulher publica um livro a relatar os seus diálogos com Jesus? Que justificação há para crer que uns falam com deus e que outros são esquizofrénicos?

A fé não é motivo para orgulhos. Ter fé no que está na Bíblia e chamar malucos aos que hoje dizem ouvir a voz de deus é ter dois pesos e duas medidas sobre assuntos exactamente iguais. E, se querem que vos diga, até preferia que acreditassem mais nas palavras da Alexandra Solnado. Pelo menos o deus dela não faz mal a ninguém.

* Artigo postado no Blog Idiotsincrasias, de Luis Ribeiro, em 22 de outubro de 2009, no sítio da Revista Visão - Portugal

UM MUSEU SUBTERRÂNEO EM MOSCOU - Aliona Legostaeva

Não é por sua rapidez que o metrô da cidade interessa a turistas de todo o mundo: suas estações são um verdadeiro museu de arquitetura russa soviética e contemporânea.

Foto: Reuters/Vostock-Photo
Em profundidades que vão de cinco (estação Petchatniki) a 80 metros (estação Park Pobedi) de suas calçadas, Moscou tem quase oitenta anos de histórias do governo, contados pelo mármore e pelo granito; pelo ferro e pelo vidro; por gostos, ideias, sonhos, esperanças e decepções de gerações passadas e das contemporâneas.

Mosaicos de metrô de Moscou Fotos: Aleksandr Ganiúschin
O metrô moscovita começou a ser construído em 1931, embora os primeiros projetos dos engenheiros Piotr Balinskov e Evguêni Knorre tenham sido sugeridos à Câmara dos Deputados de Moscou (Duma) em 1902. “De suas palavras, vinha a tentação: como o verdadeiro demônio, ele prometia colocar Moscou ao nível do mar e elevá-la aos céus", registrou o jornal Ruskoe Slovo (“Palavra Russa”) sobre a ideia de Balinskov.

Panorama da estação Electrozavódskaia 
Para a Duma, no entanto, não havia nada de tentador nas propostas dos engenheiros: a rica burguesia vivia no centro e não viajava nos trens lotados. Por isso, a princípio, a administração da cidade negou o pedido. Nos trinta anos seguintes, houve, no mínimo, mais cinco projetos diferentes para o metrô de Moscou, que não foram realizados.



Em 15 de maio de 1935, o metrô moscovita começou a trabalhar: os primeiros passageiros desceram a escada rolante de duas direções e sentaram nos macios sofás dos novos vagões (nos trens, os bancos eram feitos de madeira). A primeira linha, que seguia de Sokolnikov para Dvorets Sovietov (Palácio dos Sovietes, em russo, hoje Kropotinskaia), tinha 11 quilômetros e incluía 13 estações. Hoje, o metrô de Moscou conta com mais de 300 quilômetros de trilhos, 12 linhas e 182 estações. Nos planos de desenvolvimento da cidade, até 2020, serão construídos mais 120 quilômetros. 

Mosaicos de metrô de Moscou Fotos: Aleksandr Ganiúschin
Nos vinte primeiros anos, o metrô levou o nome de Lazar Kaganovitch – “comissário de ferro", braço direito de Stálin – que comandou a construção da primeira fase de metrô. Foi ele quem, durante o projeto da “Capital do Proletariado”, explodiu a Catedral do Cristo Redentor (reconstruída apenas na década de 90) em dezembro de 1931.

Panorama da estação Park Pobedi 
Em 1955, o metrô mudou de nome para homenagear Vladímir Lênin. Apesar das mudanças no curso da política da Rússia, suas representações podem ser encontradas em mais de dez estações: por exemplo, os bustos nas estações Bielorúski e Komsomolskaia, os mosaicos impressionistas nas estações Baumanskaia e Kiévskaia, o painel de azulejos da passagem entre a Borovitski e a estação Biblioteca Lênin. Brincadeira maldosa do destino é a estação Tsaritsino (cujo nome foi trocado para Lenino em 1990), onde Lênin mandou matar a família real, em uma cena retratada de frente e de perfil.
A mapa do metrô de Moscou
Hoje, não há imagens de Stálin, que estava presente em uma quantidade enorme de estações como símbolo da vitória na guerra do fim da década de 40, no metrô de Moscou. Após a sua morte, em 1953, o culto à sua imagem individual foi removido, esculturas foram levadas a armazéns e mosaicos e relevos foram arrancados. “Os caminhos de desenvolvimento da nossa arquitetura sobre a terra e abaixo dela não se diferenciam em nada. Tudo o que aconteceu lá em cima teve sua reverberação lá embaixo. Nunca foi ao contrário: arquitetura boa embaixo e ruim em cima”, conta o arquiteto-chefe do metrô moscovita, Nikolai Chumakov.

Sofisticação e ideologia



As primeiras estações de metrô, feitas em meados dos anos 50, eram como ricos palácios para o povo, arquitetura majestosa para um povo majestoso. Havia a ideia de que o metrô precisava ser de mármore, estuque, com partes de peças – esmaltadas e caras – de aviação: supostamente, de acordo com os construtores, o país não conseguiria preparar em um tempo curto tantos azulejos para revestir mais de mil metros quadrados. Segundo os críticos de arte, a rica decoração do metrô foi um passo ideológico e consciente – mais do que isso, um dos meios de glorificar o então novo país soviético.


Bons exemplos de arquitetura debaixo da terra do primeiro período são as estações construídas entre os anos de 1937 e 1955. Por exemplo, nas estações Maiakóvskaia e Novokuzniêtskaia, há um painel de mosaicos no teto, esboços do pintor Aleksandr Deineka: “O dia-a-dia dos países soviéticos” e “O trabalho heroico do povo soviético na retaguarda”. Eles foram reunidos pelo conhecido construtor Vladímir Frolov, autor dos ícones de mosaico da Igreja do Sangue Derramado de São Petersburgo. 



Na estação Praça da Revolução, é necessário achar no meio de 76 esculturas de bronze de trabalhadores, soldados, camponeses e estudantes o famoso guarda de front e seu cachorro – deve-se tocar em seu focinho para dar sorte. Todos os heróis, com exceção dos escoteiros, estão sentados ou inclinados, o que serviu de pretexto ao surgimento de uma triste piada: o homem soviético está sempre sentado ou de joelhos. Há uma explicação para isso, contudo. Para que as imagens das pessoas em tamanho natural coubessem nos arcos, foi preciso pedir ao escultor para desenhá-los nesta posição.

A melhor época para a arquitetura russa terminou em 1955, após a publicação de uma resolução do Partido que condenou o suposto excesso de apartamentos em projeção e construção. Sob o slogan “Quilômetros à custa da arquitetura”, construiu-se estações típicas e enfadonhas, sem trabalhos em estuque, mosaicos, colunas originais e nenhum outro elemento decorativo. Acima da terra, acontecia a mesma coisa: fabricaram-se edifícios impessoais de cinco andares, apelidados pelo povo de “khrushiovok” em referência ao então chefe do Estado Nikita Khrutchev. Para se ter ideia, basta olhar estações das décadas de 60 e 80 como Tverskaia, Kitai-Gorod e Kolomenskaia.

A terceira etapa de desenvolvimento do metrô, que poderia ser chamada de “Renascença”, começou com a reconstrução da estação Vorobiôvi Gori, em 2002. Na plataforma dessa estação, há uma bela vista do rio Moskva, o complexo esportivo Lujniki, o prédio da Academia de Ciência. Novamente, os projetos da estação ficaram a cargo dos cânones da arquitetura das décadas de 30 e 40 e, mais uma vez, pintores estão envolvidos no trabalho de desenho das estações.



Na estação Sretenski Bulvar, aparecem silhuetas de Púchkin, Gógol, Timiriazev e as paisagens de Moscou; painéis em preto e branco com os heróis dos romances “O Idiota”, “Os Demônios”, “Crime e Castigo” e “Os Irmãos Karamázov na estação Dostoiévskaia”; e uma paisagem pastoral em mosaico na estação Marina Rosha.

Em 2004, o primeiro sistema de transporte monotrilho na Rússia foi lançado, com uma linha não subterrânea (de 6 a 12 metros de altura) na parte norte de Moscou, que vai do Centro de Exposições Vserossiskoi até a estação de metrô Timiriazevskaia.



Nos próximos dez anos, o metrô de Moscou planeja ficar significativamente mais perto dos passageiros, não apenas porque alcançará ainda mais 120 quilômetros subterrâneos da cidade. "Queremos despir as estações do confinamento”, diz Nikolai Shumakov. “Tentamos mostrar ao espectador a construção, aquilo do que é feito o metrô. Ferro fundido, concreto, tudo isso é muito bonito.”

O metrô de Moscou abre diariamente às 5h30 da manhã e fecha à 1 h.

Prêmios de arquitetura do metrô de Moscou

Prêmios internacionais: estação Sokolniki (Grand Prix na Exposição Mundial em Paris, em 1937), hall da estação Krasnie Vorota (Grand Prix na Exposição Mundial em Paris, em 1937), estação Maiakóvskaia (Grand Prix na Exposição Mundial em Nova York, em 1939), estação Kropotinskaia (Grand Prix na Exposição Mundial em Bruxelas, em 1958), estação Komsomolskaia-koltsovaia (Grand Prix na Exposição Mundial em Bruxelas, em 1958).

Vagões incomuns

Se você tiver sorte, poderá andar em um vagão no estilo retrô, em uma galeria de arte sob rodas ou em uma biblioteca. Trens desses tipos estão inseridos no esquema normal de tráfego – ou seja, andam sem programação especial – em linhas específicas.

Vagão “Aquarela”: a parte externa do trem parece um caixão, com flores e frutas desenhadas. Por dentro, é uma galeria de arte com reproduções de quadros da coleção do Museu de Pintura V.M. e A.M. Vasnetsov. Fica na linha Arbatsko-Pokrvskaia (azul).

Vagão “Moscou que lê”: por dentro normal em um primeiro olhar, o trem é um cartão-postal de produção literária e ilustrações para crianças e adultos. Em cada vagão, há algo diferente, de contos de fadas infantis a Gogól. Fica na linha Koltsovaia (marrom).

Vagão “Poesia no metrô”: restaurado neste ano, a decoração do vagão foi dedicada aos poetas italianos, dentre eles Dante Alighieri, Francesco Petrarca e Giacomo Leopardi. Todas as produções e biografias são apresentadas em duas línguas: russo e italiano. Fica na linha Filevskaia (azul-escura).

Vagão “Sokolnik”: por dentro e por fora, parece exatamente como o primeiro trem do metrô de Moscou. Possui sofás macios, paredes de acabamento característico e luminárias retrô. É pintado na cor marrom. Fica na linha Sokolnitcheskaia (vermelha).

Extraído do sítio Gazeta Russa

28 de dezembro de 2011

BARCA BELA - Almeida Garrett

Pescador, de João Werner
Pescador da barca bela, 
Onde vais pescar com ela. 
Que é tão bela, 
Oh pescador? 

Não vês que a última estrela 
No céu nublado se vela? 
Colhe a vela, 
Oh pescador! 

Deita o lanço com cautela, 
Que a sereia canta bela... 
Mas cautela, 
Oh pescador! 

Não se enrede a rede nela, 
Que perdido é remo e vela, 
Só de vê-la, 
Oh pescador. 

Pescador da barca bela, 
Inda é tempo, foge dela 
Foge dela 

27 de dezembro de 2011

TURISTAS VIRAM 'CAÇADORES' DE AURORA BOREAL EM PAÍSES DO ÁRTICO - Rob Hugh Jones

Enquanto que nos Estados Unidos os chamados "caçadores de tempestades" tentam perseguir tornados e furacões, na região do Polo Norte existem grupos que "caçam" auroras boreais, ou luzes do Norte.

Keen viu um documentário sobre a aurora boreal na televisão e resolveu observar as luzes. Agora ele se declara 'viciado'. Atualmente, ele mora dois graus acima do Círculo Ártico. Imagem: © Andy Keen www.aurorahunters.com
Estes grupos percorrem regiões da Finlândia e da Noruega atrás das melhores chances de registros do fenômeno de luzes. Muitos contam com a ajuda de empresas de turismo especializadas em aurora boreal.

O britânico Andy Keen abandonou seu emprego há cinco anos e foi morar em uma área remota da Finlândia, onde se transformou em 'caçador de aurora boreal'. Imagem: © Andy Keen www.aurorahunters.com
Este foi o caso de Andy Keen, que há cinco anos deixou o emprego na Grã-Bretanha, onde dirigia uma instituição de caridade, e se mudou para Ivalo, um vilarejo remoto no norte da Lapônia, Finlândia, a 68 graus de latitude, dois graus acima da linha do Círculo Ártico.

Atualmente, ele tem uma empresa de turismo especializada em levar pequenos grupos para observar as luzes durante o inverno no hemisfério norte. Acima, um dos clientes de Keen. Imagem: © Andy Keen www.aurorahunters.com
"Vi um documentário na televisão a respeito das luzes do Norte. Então fui até lá para ver. Agora, estou viciado", disse.

Keen fundou a Aurorahunters ("Caçadores de Aurora", em tradução livre), que leva sete turistas por semana para viagens em partes mais remotas da região, em busca de auroras boreais.

As luzes da aurora boreal podem ser vistas na região da Escandinávia, América do Norte, norte da Escócia e Rússia. Mas, como alerta o site de turismo da Noruega, nunca se sabe onde as luzes vão aparecer. Imagem: © Andy Keen www.aurorahunters.com

"A razão de eu ter escolhido este lugar é que a população é muito baixa, há pouca luz ou poluição sonora e é um território perfeito para a aurora", disse.

'Dama astuta'


O grande problema da "caça" à aurora é a dificuldade em prever onde ela vai aparecer.

No entanto, Keen estuda, junto com sua equipe, mapas meteorológicos para saber a posição das nuvens e escolher o melhor lugar para a observação da aurora boreal. Imagem: © Andy Keen www.aurorahunters.com
Em seu site, a agência oficial de turismo da Noruega chega a comparar a aurora boreal a uma "dama astuta". "Você nunca sabe quando ela vai aparecer. Esta diva vai te deixar esperando", diz o site.


Por isso, empresas como a de Keen estudam informações meteorológicas para tentar encontrar o melhor lugar para ver as luzes.

Assim que a equipe consegue estimar o melhor local, com menos nuvens, Keen e os turistas viajam em micro-ônibus e até trenós puxados por cães para as áreas mais remotas da Finlândia. Imagem: © Andy Keen www.aurorahunters.com
"Estamos checando relatórios sobre as nuvens. Observamos o movimento, a densidade das nuvens. Estamos apontando para um lugar onde sentimos que, em um momento específico, vai haver um buraco nas nuvens", afirma Keen.

O 'caçador' afirma que os melhores meses para a observação das luzes são janeiro, fevereiro e até o meio de março, quando a maior parte da neve já caiu e o céu tem uma quantidade menor de nuvens. Imagem: © Andy Keen www.aurorahunters.com
As excursões para os locais escolhidos são realizadas em micro-ônibus ou trenós puxados por cães, especialmente para chegar em áreas de difícil acesso.

Cientistas também estimam que 2012 e 2013 serão ótimos anos para a aurora boreal. A atividade solar deve aumentar e os ventos solares são determinantes para a intensidade da luz. Imagem: © Andy Keen www.aurorahunters.com
Vento solar

"O processo que causa a aurora é parecido com a física das luzes de neon", afirma Joseph M. Kunches, cientista espacial no Centro Espacial de Previsão do Tempo dos Estados Unidos, parte da Associação Nacional Oceânica e Atmosférica (NOAA, na sigla em inglês).

O espetáculo se estende pelo inverno do hemisfério norte. No verão, quando as noites são curtas ou simplesmente não existem, as luzes não podem ser vistas. Mas, a atividade volta em outubro, com o início do outono. Imagem: © Andy Keen www.aurorahunters.com
"Um elétron interage com átomos neutros e emite luzes de várias cores. O que acontece quando a aurora brilha é que as partículas vindas do Sol - a maioria delas são elétrons - são trazidas pelos ventos solares na direção da Terra e guiadas pelos polos magnéticos do planeta."

"Quando as partículas interagem com a atmosfera da Terra, elas estimulam moléculas que já estão aqui, e estas emitem luzes", acrescentou.

Kunches afirma que a cor das luzes depende dos gases na atmosfera terrestre (oxigênio, nitrogênio ou outros). "E, quando os ventos solares são mais fortes (...), as auroras serão mais brilhantes".

O cientista avisa que, nas temporadas de 2012 e 2013, a previsão é de muita atividade solar, portanto as auroras boreais serão mais frequentes.

Kunches afirma que o Polo Sul é afetado da mesma forma pela atividade solar. Mas, existe a diferença sazonal: no norte, a aurora é vista no inverno, quando tudo fica escuro.

No sul, as regiões são iluminadas 24 horas por dia, então não é possível ver as luzes.

No norte, a aurora boreal pode ser vista nos países escandinavos (Noruega, Suécia e Dinamarca), Finlândia, Rússia, América do Norte e norte da Escócia.

Céus limpos

Assim como Joseph Kunches, Andy Keen espera boas oportunidades para ver a aurora boreal em 2012.

"Nos primeiros meses do ano, particularmente em janeiro, fevereiro e até o meio de março, temos céus limpos", disse.

Uma das condições para uma boa visão das luzes é o céu livre de nuvens. Keen afirma que não é necessário sequer um céu sem a Lua. Na verdade, o 'caçador' afirma que a Lua cheia até ajuda a tornar a paisagem mais bonita. Imagem: © Andy Keen www.aurorahunters.com
Neste período a maior parte da neve já caiu e há menos nuvens no céu.

No entanto, no verão, quando as noites são curtas ou sequer ocorrem, é o período ruim para os caçadores destas luzes. Eles voltarão a ter mais atividade a partir do outono no hemisfério norte, que começa em outubro.

O fotógrafo finlandês Martti Rikkonen, um dos mais famosos fotógrafos de natureza do país, ganhou um prêmio nacional em 1995, com uma imagem da aurora boreal. Ele afirma que muitos finlandeses não dão tanta importância para as luzes.

"Para muitas pessoas, não é nada especial, pois temos elas com muita frequência. Você pode ver (as luzes) com tempo limpo talvez 200 noites por ano. Mas quando elas estão boas, todo mundo se interessa, pois há tanta cor e elas são fantásticas", disse.


Extraído do sítio da BBC Brasil